What If?...
Os resultados são tão claros quanto surpreendentes: David Cameron e os Conservadores ganharam a eleição por larga margem, atingindo a maioria na Câmara dos Comuns sem precisar de qualquer coligação. A vitória de Cameron fica tão mais clara no espelho do descalabro eleitoral de Trabalhistas, Liberais Democratas e dos sujeitos do UKIP - ao ponto dos líderes dos três partidos terem já anunciado a sua demissão. Os escoceses do SNP são os segundos grandes vencedores da noite, ganhando 36 dos 39 lugares disponíveis para a Escócia em Westminster. Os Trabalhistas foram varridos da Escócia e o SNP voltou a colocar a independência da Escócia na agenda - o que será seguramente um ponto de tensão entre o SNP e os Conservadores.
Para quem não tenha votado nos Conservadores, este é o pior resultado possível. Os Trabalhistas têm menos assentos em Westminster que em 2010 e os Lib Dem desceram de 57 para 8 MPs (!). Qualquer hipotético efeito "atenuante" que Clegg & co tivesse num governo conservador até aqui desapareceu.
Feita a análise óbvia aos resultados, gostava de me debruçar sobre outro aspecto. Os Trabalhistas fizeram uma boa campanha. Não apenas uma campanha esforçada, mas uma campanha sólida. Desde a apresentação de ideias claramente diferentes dos Conservadores ao uso competente das redes sociais à stunt de última hora com Russell Brand, a campanha eleitoral dos Labour foi claramente bem planeada e executada. Ed Miliband, penso, conseguiu passar a imagem de um líder honesto, apaixonado pelas causas que defende. Mas os resultados eleitorais foram um desastre. O problema não foi só a Escócia: mesmo que todos os assentos do SNP passassem para os Trabalhistas, os Conservadores tinham a maioria. O que falhou?
Não consigo precisar. No caso dos Lib Dem, é óbvio: os Conservadores, sabe-se lá como, conseguiram a passar a imagem que os Lib Dem eram os maus da fita da coligação e o eleitorado que votou Lib Dem em 2010 não terá seguramente perdoado o facto das promessas eleitorais de 2010 tenham sido frontalmente descartadas - estou a pensar sobretudo no "aumento brutal" (obrigado, saudoso Vítor Gaspar) das propinas universitárias, cujo impacto estou também a sofrer desde Setembro. O UKIP pode colocar a culpa da sua falta de representação no sistema eleitoral. Mas os resultados dos Trabalhistas são surpreendentes e difíceis de explicar.
Daí a imagem de David Miliband que encabeça este artigo. Em 2010, os dois irmãos Miliband, David e Ed, concorreram à liderança do Partido Trabalhista, na sequência da derrota de Gordon Brown, que anteriormente tinha sido Chancellor (Ministro das Finanças) de Tony Blair durante largos anos.
David Miliband era o favorito: long story short, não tem o ar de choninhas de Ed Miliband e tinha experiência governativa enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros de Blair. Ed não tinha essa experiência e tinha fama de ser mais 'à esquerda'. O desgaste do legado centrista de Blair e do New Labour e a fama de Ed significar uma viragem à esquerda no partido. Essa alternativa e o apoio dos sindicatos fizeram Ed ganhar as eleições no Partido Trabalhista, de forma surpreendente. David abandonou a política.
5 anos mais tarde, 'Red Ed' (como foi "carinhosamente" apelidado Ed Miliband em 2010 pela imprensa britânica de direita) perdeu as eleições de forma clamorosa, frente a um Partido Conservador que gerou bastante atrito durante o primeiro mandato de Cameron. E se David Miliband tivesse ganho?
Permitam-me fazer o paralelo com Portugal (caso contrário mais valia ter escrito em inglês): o PS viu-se recentemente confrontado com a mesma escolha que os Trabalhistas enfrentaram em 2010: de um lado, um António com melhor imagem (o mito da "boa imprensa" já desapareceu) e experiência governativa, embora num governo que causou bastante desgaste. O outro António era seguramente um homem honesto, apaixonado pelas causas que defende - mas um choninhas de primeira apanha.
E se Seguro ainda fosse Secretário-Geral do PS?
P. S. - palavra que ainda não percebi os queixumes sobre o sistema eleitoral inglês. O first past the post tem seguramente problemas de representatividade, mas não surgiu na quarta-feira. Compreendo que com o surgimento de novos partidos as suas deficiências fiquem mais à vista, mas o sistema já é velho.